Quando revejo fotos do meu passado, se passa um filme na minha cabeça, eu não era linda e maravilhosa. Eu me sentia tão pequena, mesmo sendo a mais alta da turma e invisível, embora eu desejasse isso para não ouvir comentários tão maldosos de pessoas, que eram tão feias quanto eu e todos riam das piadas idiotas, como se eu simplesmente fosse uma escultura mal moldada. Tem uma novela que eu amo desde pequena, se chama "A feia mais bela", ela é mexicana e eu sonhava em me transformar um dia igual a personagem principal, assim como a personagem que passou a ser invejada pela beleza e ser bem tratada por todos que riram dela. A gente diz que a aparência não importa, mas importa lá no fundo e nos pegamos chorando por isso, por não ser bela igual as patricinhas ou as tolinhas, que não adianta tirar 10 na prova, não seria tão bem visto, apenas inveja ou desesperados pedindo ajuda para não reprovar, mas nada comparado com a saia curta e rodada da lindinha. O meu rosto era redondo, muito alta, cheia de cicatrizes da catapora, usava aparelho, tinha o cabelo preto, cacheado, volumoso e queimado nas pontas. Essa era eu, a patinha feia e desmerecida, eu era uma piada, quando diziam que queriam ficar comigo era zoação ou era em segredo, não era respeitada, exceto nas provas e trabalhos na minha turma pelo menos, porém eles me defendiam dos outros. O garoto que eu gostava nunca imaginou que eu sentisse qualquer coisa por ele, mesmo eu fazendo os trabalhos com o irmão dele, a atenção era dele e eu sempre ria com ele, antes do aparelho, os meus dentes eram muito tortos e eu não podia rir, mas com ele, eu ria de verdade e sentia que um dia ele me notaria e sentia medo de até ele me rejeitar, que a nossa amizade iria se acabar.
Recentemente quando fui ficar com um cara que me conhece desde criança (eu só conhecia por ouvir sobre ele), me chamou para ficar e ele disse uma frase que não sai da minha mente, que foi "se eu soubesse que você era tão gostosa, eu teria ficado antes." Aquilo me fez sentir que a transformação que eu fiz em cada parte minha serviu para conseguir outras coisas, outro patamar, eu estava sendo notada e vista por terceiros. Tirei o aparelho, cicatrizou as marcas, comecei a usar mais a chapinha no cabelo todo, pintei o cabelo, furei o nariz e as orelhas, mudei o meu estilo e comecei a me transformar em alguém que eu desejava, eu sempre quis ser ruiva e dar uma extravasada no meu visual. Cortei e deixei o meu cabelo mais longo, eu fiquei como eu gostaria e percebi que outras pessoas também ficaram satisfeita. Me deram like nos apps de relacionamento, curtiram fotos, comentaram ou mandaram mensagens. No fundamental, eles diziam que eu não era guria, nem me consideravam como paquera, nem o cara mais feio tinha dó por sermos tão rebaixados, preferia morrer virgem e não que eu quisesse algo, porém desejava consideração. O colegial foi um inferno na minha vida, o fracasso deles hoje me faz acreditar no karma e é a minha consolação. A derrota deles não é a minha felicidade, é uma leve satisfação e parte do troco. A beleza não levou eles a nada, a minha dedicação me fez chegar até aqui e me moldei do meu jeito, eu deixei de ser a rata que leva e trás declarações patéticas e desesperadoras, se esqueciam que a rata era alfabetizada e havia humilhação nas cartas e publicamente por serem babacas, entretanto não era minha culpa e eu não tinha nada a ver.
Eu me considerava uma criança bonita, no entanto, quando chegou a adolescência tudo desandou e por mais que eu tentasse, nada resolvia para eu ter amor próprio. Nenhum espelho mostrava o que eu queria ver, além de conviver com pessoas completamente cruéis e hipócritas muitas vezes. Pouco me importa, o que elas são hoje, simplesmente não quero nada com os escrotos, assim como elas me tratavam de uma forma cruel, que eu não era merecedora. Nunca pisei em ninguém para subir na vida e nem fazendo coisas pelas costas. Foi aí que descobri a crueldade humana, que te abraçam pela frente e te esfaqueiam por trás, as famosas talaricas não eram consideradas inimigas, se diziam amigas e eu não queria isso na minha vida. Eu tinha outros objetivos, não de ser tão baixa quanto muitas delas e suja. É extremamente exaustivo compreender a cabeça dos adolescentes, principalmente as garotas, nem o garoto mais desejado da escola melhoraria aquele inferno. Mudar de ideia sobre alguém, talvez só se for para esfregar na cara dele que o jogo virou ou que tenha sido gentil,e o mundo girou, que agora eu sou um cisne e ninguém vai cortar as minhas asas, elas vão me levaram aonde eu quiser sozinha, sem depender de ninguém e agora com amor próprio, quase completamente satisfeita com a minha aparência. Por mais feia que eu fosse, ninguém tinha o direito de me rebaixar, como se eu fosse um nada, talvez eu tenha sido para eles, entretanto esse sempre foi o meu tudo, que eu poderia ser e eu tinha que lidar com todas as situações sozinha. A escola muda a gente, desgraça a nossa mente e quando saí foi o meu sonho de liberdade, quando eu entrei na federal, os horários mudaram e as pessoas que eu conheci eram completamente diferentes daqueles moleques. Ainda bem que tudo é uma fase e estou bem melhor comigo mesma.
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